MICROLOGIA: ORIGEM DA DOENÇA NO INVISÍVEL AOS OLHOS

Prof.Dr.HC João Bosco Botelho

            Apesar dos claros resíduos do pensamento greco-romano nas práticas médicas, até o século 19, o processo de mudança estava delineado no Renascimento, especificamente, na busca da materialidade da doença em dimensões só visíveis por meio das lentes de aumento.

            Esse novo avanço em direção à matéria invisível aos olhos desarmados — pensamento micrológico — foi iniciado com os trabalhos de Marcelo Malpighi (1628-1694) que publicou o livro De Viscerum Structura, em 1666, alguns aspectos da micrologia dos tecidos da língua do boi iniciando o segundo corte epistemológico da Medicina.

O século 17, também caracterizado pelo aperfeiçoamento das lentes de aumento, impulsionou o microscópio e, como consequência, o pensamento micrológico na busca da causa das doenças no mundo invisível aos olhos. Eu entendo essa extraordinária mudança como o segundo corte epistemológico da Medicina.

A genialidade de Marcelo Malpighi estava em sintonia com algumas variáveis importantes, presentes no século 17. Além do estímulo coletivo de busca da materialidade da doença que contagiou a Europa, os novos estudos da ótica foram fundamentais para produzir microscópios mais potentes.

O depoimento de Malpighi ao utilizar as lentes de aumento trouxe à materialidade e ao visível outro mundo inimaginável: “O aparelho é fixado num círculo, móvel na base para ver tudo é preciso girá-lo, num só golpe de olhos, pode-se ver apenas uma pequena parte do conjunto… Para observar objetos muito grandes é preciso poder distanciar e aproximar as lentes e isso é possível graças a mobilidade do aparelho.. Deve ser usado com um ar sereno e límpido, sendo melhor utilizável ao sol, para que o objeto seja bem iluminado. Contemplei inúmeros animais pequenos com a admiração infinita: entre eles a pulga é horrível, o mosquito e a traça os mais belos e foi com grande contentamento como fazem a mosca e outros pequenos animais para caminhar”.

A histologia, o estudo das microscopias dos tecidos, propostas por Malpighi trouxe a doença da macroestrutura (corpo), para a microestrutura (célula). Esse fato abriu a porta que desvendou a base da Medicina da atualidade: o diagnóstico microscópico, deslocando a doença da macrodimensão (o corpo, o órgão) para a microestrutura dimensão (a célula, a bactéria) e renorteou as práticas médicas.

A maior parte das ações de saúde que são realizadas, na atualidade, é alicerçada no diagnóstico da infecção (qual a bactéria?) ou do tumor (qual o tecido onde o tumor iniciou?).

Nessa conjuntura, o pensamento micrológico atenuou os medos pessoais e coletivos em relação às epidemias de doenças infecciosas que mataram milhões de pessoas. O diagnóstico passou a identificar por meio do microscópio o tipo do tumor ou da infecção. Este fato é facilmente comprovado pelas grandes campanhas mundiais de esclarecimento de como podemos evitar o câncer e as infecções. Em todos esses casos o diagnóstico é obtido do estudo da microestrutura.

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