CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA NA GRÉCIA PLATÔNICA E HIPOCRÁTICA

Prof.Dr.HC João Bosco Botelho

O marco organizador da ética médica na Grécia platônica e hipocrática foi a escola de Cós e Hipócrates o principal agente. Apesar de os indicativos etimólogos e linguísticos indicarem que as 72 obras contidas no “Corpo Hipocrático”, como é conhecido o conjunto de textos produzidos na ilha de Cós, somente 12 terem sido escritos por Hipócrates, esse conjunto filosófico e médico iniciou o processo da separação da Medicina das ideias e crenças religiosas e instrumentalizou a ética médica.

Um dos mais importantes é o texto de Políbio, genro de Hipócrates, que elaborou a Teoria dos Quatro Humores, a primeira para explicar a saúde e as doenças fora das ideias e crenças religiosas. O corpo seria constituído de quatro humores: sanguíneo, linfático, bilioso amarelo e bilioso preto; quando ocorresse a predominância de um sobre os outros, ocorreria a doença. Por essa razão, é possível considerar esse acontecimento como o primeiro corte epistemológico da Medicina.

Um exemplo marcante da presença do pensamento jônico é o livro “Dos ventos, águas e regiões”, de autor desconhecido, do século 4 a. C., que assegura a impossibilidade de ser bom médico aos que não conhecem as características das estações do ano, o clima, os ventos, as águas e o curso do Sol.

Platão, além de reconhecer a notabilidade de Hipócrates, deixou claro algumas características da Medicina grega desse período, com forte influência dos conceitos jônicos da natureza. Entre os mais importantes a noção de físis, como elemento de ligação da Medicina à materialidade da doença.

Nesse contexto, com certa influência jônica das igualdades do clima sobre todos, no extraordinário livro “Leis” (857D e 720 C-D), pela primeira vez na História, Platão aclarou à humanidade que, naquele tempo, como hoje, existia marcante diferença entre as práticas médicas nos ricos e pobres.  De modo satírico, Platão descreve que quando estão contando pessoas ricas, os médicos explicam detalhadamente a doença e as características do tratamento. Ao contrário, quando consultam os escravos, as consultas eram rápidas, sem qualquer explicação sobre a doença e o tratamento.

Um dos textos da Escola de Cós, o Juramento, voltado ao interesse do doente, mesmo com forte presença das ideias e crenças religiosas ainda no parágrafo introdutório, é o estágio divisor entre o antes e o depois na história da ética médica. Desse modo, a Medicina iniciou outra fase – ser útil ou não ser nociva à vida humana (primum non nocere) – e o médico entendido como o agente dessa ação. A segunda mais importante mudança em relação ao Código de Hammurabi foi a introdução do segredo médico. A vertente dominante para conceber a Medicina como suporte à vida, jamais causando malefício, também está no juramento ao condenar a cirurgia para a retirada da pedra da bexiga, quando sempre determinando a morte do doente.

Ao lado desses extraordinários avanços e controle ético da Medicina, os gregos não abandonaram os deuses protetores. Asclépio, o deus protetor da Medicina, filho de Apolo, também curador, com a bela mortal Corones, foi educado pelo centauro Quirão, para ser mais cirurgião do que médico. O deus da Medicina grega, representado pela serpente enrolada no bastão da madeira, era celebrado, no dia 18 de outubro, na mesma data na qual, na atualidade, os médicos continuam comemorando o dia da Medicina, sob a proteção de São Lucas, o evangelista médico.

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