O ABORTO ENTRE OS FILÓSOFOS E DOUTORES DA IGREJA

Os poderes laicos, em diferentes instâncias, ao longo de quatro mil anos, têm adotado diversas atitudes frente ao aborto como método anticoncepcional. Por outro lado, tanto nos livros sagrados das culturas politeístas, do primeiro milênio a.C., quanto no Antigo Testamento não parece que a interrupção intencional da gravidez, salvo pelo risco de morte materna, causasse tanta repulsa.
O AT e o Novo Testamento, mesmo contendo referências específicas sobre a organização familiar não citam uma só vez de modo explícito qualquer tipo de conde-nação ao aborto como método anticoncepcional. É como se o fato, que incontestavel-mente deveria ocorrer, não tivesse qualquer importância. A Bíblia não condena nem aprova a interrupção da gravidez por meio do aborto provocado.
É difícil aceitar que a ausência de citação no AT seria porque as sociedades ju-dias não conheciam essa forma de método anticoncepcional. É mencionada a pena do agressor de mulher grávida, se a brutalidade resultasse em aborto. Contudo, o cas-tigo tem sentido indenizatório.
O 2º Livro de Samuel descreve o drama do rei Davi após engravidar a mulher do general Urias. A gravidez próxima de ser descoberta pelo povo, que acreditava o rei acima do pecado, o aborto não fora aventado. Como opção, o rei conquistador deter-minou a morte do militar, na frente de combate, para que fosse possível casarem-se sem macular as leis judaicas..
A mais antiga e clara referência cristã antiabortiva está no Didaqué, manual éti-co moral, escrito nos anos 100: “Não matarás criança por aborto, nem criança já nasci-da”.
O filósofo cristão Tertuliano (190 197) também adotou a posição antiabortiva absoluta: “É homicídio antecipar ou impedir alguém de nascer. Pouco importa que se arranque a alma já nascida ou que se faça desaparecer aquela que está ainda por nascer. É já um homem aquele que virá”.
São Jerônimo (331 420), um dos quatro Doutores da Igreja, na correspondência à Algásia, argumentou se antepondo à restrição absoluta de Tertuliano: “Os sêmens se formam gradualmente no útero e não se pode falar de homicídio antes que os elementos esparsos recebam a sua aparência e seus membros”. Contudo, em outra carta, o monge de Belém considerou as mulheres que escondiam a infidelidade conjugal com o aborto como culpadas de triplo crime: adultério, suicídio, assassinato dos filhos. Nesse caso, parece que a restrição ao aborto como método anticoncepcional estaria ligada à crítica à infidelidade.

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