PRÁTICAS MÉDICAS NO TALMUDE

Prof.Dr.HC João Bosco Botelho

            O Talmude é um livro sagrado dos judeus, que trata dos registros rabínicos em torno da lei, da ética, dos costumes e da história do judaísmo. É composto de duas partes: a Mishná (200 d.C.), o primeiro compêndio escrito da Lei Oral; e o Guemará (500 d.C.), uma discussão da Mishná e dos escritos tanaíticos abordando outros tópicos, expostos no Tanakh.

            O Mishná foi redigido pelos mestres chamados Tannaim (“tanaítas“), termo que deriva da palavra hebraica que significa “ensinar” ou “transmitir uma tradição”. Os tanaítas viveram entre o século 1 e 3 d.C. A primeira codificação é do rabino Akiva (50130); a segunda, do rabino Meir (entre 130 e 160 d.C.). As versões foram escritas no atual idioma aramaico, ainda em uso no interior da Síria.

            Especialmente, no medievo europeu, os médicos judeus não seguiam as interferências dogmáticas do cristianismo nas práticas médicas que proibiam o estudo da anatomia humana, qualquer tipo de manuseio do sangue, inclundo as cirurgias. Além do mais, as autoridades eclesiásticas trancavam, hermeticamente, nas bibliotecas dos conventos e abadias as publicações manuscritas greco-romanas. Para vencer essas barreiras, os médicos judeus traduziram livros médicos greco-romanos, em especial, os de Hipócrates e Galeno.

É possível que essas alternativas para superar o isolamento tenham sido precipitadas após a proibição do imperador Teodósio, em 438, proibindo os médicos judeus na administração pública.

Eram conhecidos os impressionantes saberes médicos do Tal­mud, plenos de recomendações aos cui­dados da saúde individual e coletiva em nível curativo e profilático.

Entre as centenas de referên­cias, existem três particularmente interessantes:

– Pagamento pelo serviço do médico: “Um mé­dico que trabalha sem cobrar, não vale nada” (Baba cama 80a). Essa recomendação está ligada à tradição babilônica, que considerava o serviço médico fruto de atividade profissional, devendo ser remunerada de acordo com o grupo social do doente. Essa constatação está absolutamente clara no Código de Hammurabi, tendo esse avanço da Medicina como especialidade social sido absorvido pe­los gregos e aperfeiçoado pelos ro­manos nos primeiros séculos. Acabou abandonado a partir da aceitação coletiva da pré­via cristã de que o ato de curar esta­va incorporado na prática da carida­de;

– Proibição dos médicos vindos de ter­ras distantes atuarem sem o devido conhecimento das condições locais de vida: “Uma pessoa não deve permitir que seja tratada por médico proveniente de terras distan­te, pois este não conhece suficiente­mente as características do melo ambiente e as influências do clima” (Baba cama 85a);

– Impõe cuidados com os remédios: “Não se devem fazer ensaio, com nenhum medicamento, nenhuma prescrição ou conjuro do Talmud, sem que se conheça o seu verdadeiro uso” (Yalcut).

O Talmud babilônico contém estudos de anatomia e fisiologia do esôfago, laringe, traquéia, pulmões, meninges, órgãos genitais, coração, fígado, baço, rins e intestinos. O sangue constitui o princípio vital e são reconhecidos 248 ossos.

Como os judeus, os outros povos, na antigüidade, habitavam territórios próximos dos lagos e rios piscosos com áreas alagadiças, as febres e as complicações hepáticas eram temidas. Outras doenças foram descritas, como a loucura, angina, a asma e a hemofilia identificada como doença hereditária.

Os procedimentos cirúrgicos também estão citados no Talmud: a cirurgia da fístula anal, a redução das luxações e a cesariana.

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