O ENSINO DAS CIÊNCIAS DA SAÚDE FRENTE À TECNOLOGIA

PROF. DR. HC JOÃO BOSCO BOTELHO

  1. A ASSOCIAÇÃOO HISTÓRICO PILAR DA UNIVERSIDADE

O ensino das ciências da saúde frente à tecnologia, nos anos noventa, está inserido na dinâmica dos conceitos sobre os quais a universidade caminha.

Assim sendo, as ciências da saúde como partes do ensino do terceiro grau, recebe os avanços e os retardos da instituição que lhes guarda. Por essa razão, é indispensável rever alguns aspectos históricos do ideário universitário.

O esforço para sistematizar e agrupar estudantes da cristandade, no século XII, gerou o Studi generaliza-o ideal universais em torno de uma corporação legal prosperou, no final da Idade Média, em Bolonha e Paris.  Graças a esse extraordinário talento – a natureza associativa – que as universidades têm resistido a tantas perseguições e trapaças por conta de governos e dirigentes.

A sobrevivência da universidade nos oito séculos de existência mostrou-se difícil.  Em certos momentos, quando a grosseria das religiões e dos partidos avançam sobre ela, com o objetivo de moldá-la às ideologias, o futuro torna-se frágil e incerto.

Foi assim, na Europa medieval, com o cristianismo impondo a supremacia aristotélica, na Alemanha nazista, ao libertar as universidades da vergonha judia e no stalinismo, ao infligir toda a sabedoria como simples dedução da dialética marxista-leninista.

A partir da crítica, tecida pelos partidos de esquerda, de que a universidade terceiro-mundista era uma ilha de privilégios dos pequenos burgueses luta de classes, pressuposto do marxismo revolucionário, atingiu em cheio, com o atraso de cinquenta anos, o ensino superior do Terceiro Mundo.

As mudanças sociais, na América Latina, impuseram, sempre em torno da associação – pilar maior da sobrevivência universitária – novas alianças.  Sob os confrontos político-ideológicos, as intrujices foram renovadas e denominadas.

No Brasil, a vida acadêmica, antes organizada em torno dos professores titulados, a exemplo das centenárias bases da hierarquia universitária, estremeceu e ainda está desnorteada perante a violência dos grupos políticos que dominam os colegiados.

Nessas condições, em muitas universidades, sob o simulacro da postura democrática, quem ousar escrever uma tese ou expressar pensamentos diferentes dos da linguagem padronizada, arrisca-se ser rotulado de, no mínimo, alienado.

Desde a Idade Média, ferida pela religião, até a modernidade, agredida pela grosseria ideológico-partidária, a universidade continua resistindo às distorções do real, urdidas por políticos profissionais e pelos que nunca foram e nunca serão educadores.

  1. TÉCNICA E TECNOLOGIA

É fundamental distinguir os dois conceitos.  A técnica está inserida nos processos de guarda e reprodução dos conhecimentos, historicamente acumulados, relacionados com o saber fazer, atendendo às necessidades pessoais e coletivas de sobrevivência.  A tecnologia engloba a técnica através das ciências, envolvendo-a sob o manto do método da pesquisa científica.

O salto da técnica à tecnologia é o responsável direto pela exigência de adequar as universidades ao avanço industrial.  Pode-se, sem dúvida, questionar o valor da ligação, porém o fato é concreto e serve de parâmetros para identificar certas universidades (Berkeley, Columbia, Paris, Oxford, Stanford, entre outras), em países com altas rendas per-capita, como exemplos de instituições onde a tecnologia integra o ensino e a pesquisa.

Essas universidades, situadas em países com democracias sólidas, nunca se afastaram da centenária estrutura da produção acadêmica em torno dos professores titulados.

Tornaram-se respeitadas desenvolveram-se em torno de seis pontos:

  1. Resistência a burocratização;
  2. Estrutura administrativa moldada às exigências e potencialidades das pesquisas pura e aplicada;
  3. Recrutamento de professores competentes e motivados;
  4. Construção de laboratórios de pesquisa;
  5. Constante consulta ao sistema produtivo;
  6. Rigor na produção científica.

III. PESQUISA E ENSINO

A tecnologia chegou, há mais de quarenta anos, nas universidades do Primeiro Mundo e consolidaram a estreita dependência entre o ensino e a pesquisa.

As influências oriundas do processo industrial moldaram as universidades à formação de profissionais e cientistas qualificados às exigências do Estado Moderno como organizador do saber institucional.

Salvo exceções, a pesquisa acoplada ao ensino ainda ensaia os passos iniciais em poucas instituições de ensino superior do Terceiro Mundo.

No Brasil, com o pressuposto de aniquilar a lembrança da intolerância dos anos de arbítrio institucional, a maior parte das universidades brasileiras optou pela “redemocratização exclusiva”.  As direções dos órgãos universitários passaram a ser disputados pelos partidos.  O resultado foi a Ascensão de políticos-professores inexpressivos, sem produção acadêmica e sem titulação, em áreas importantes da administração.  O saldo está mostrando-se trágico no imobilismo dos grupos rivais que pregam “não foi o meu candidato, dane-se”.

Contudo, o mais grave e que já atingiu, mortalmente, a hierarquia da titulação e com isso, a produção acadêmica do ensino e da pesquisa.

A afirmação está bastante clara se compararmos os dados concernentes ao número de professores, alunos e publicações científicas em quatro universidades brasileiras, no ano de 1982:

No Brasil como na Inglaterra e na Alemanha, diferente dos Estados Unidos da América, o Estado teve um papel importante no processo de industrialização.  Como explicar que, até hoje, as universidades públicas, brasileiras, salvo exceções, não participem do processo industrial?

Infelizmente, o que se constata, ao contrário, é que a universidade pública brasileira:

  1. se distancia, cada vez mais, dos canais de Ascensão social;
  2. Não é mais o centro formador das elites;
  3. Pouco contribui na formação profissional;
  4. A pesquisa torna-se cada vez mais difícil.
  5. As ciências da saúde frente a essa realidade

A questão fundamental é estabelecer as prioridades dessa universidade politizada, desacreditada e dissociada do processo produtivo, num Brasil onde trinta milhões de pessoas vivem em miséria absoluta.

Na realidade, é mais do que isso. Ou as universidades públicas buscam o acesso ao processo produtivo, integrando-se à sociedade que as financiam, ou elas sucumbirão frente a inércia da   irrisória publicação científica.

Vencidas as dificuldades quanto a excessiva politização político-partidária, a admissão de professores motivados e a montagem dos laboratórios, as ciências da saúde poderão participar, com importante parcela, da inevitável reestruturação das universidades públicas em torno do ensino e da pesquisa através de três pontos fundamentais:

  1. Formação de profissionais – médicos, biólogos, bioquímicos-farmacêuticos e dentistas – capazes também de exercerem a profissão em torno dos programas fundamentais de saúde pública;
  2. Produção de alimentos alternativos e de menores custos;
  3. Domínio da biodiversidade para a produção de remédios.
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